segunda-feira, 29 de junho de 2015

Dossiê de Teoria na Revista Conexão Política

A nova edição da revista Conexão Política traz um dossiê dedicado à teoria política contemporânea, com ênfase na produção de jovens pesquisadores e pesquisadoras. O periódico é publicado pelo programa de pós-graduação de ciências sociais da Universidade Federal do Piauí (ver aqui lista das edições anteriores) e tem se notabilizado pela excelente arte gráfica de suas edições e pelo espaço que tem dado à trabalhos de teoria política (na definição mais estrita do termo). Ótima notícia para a teoria política brasileira !











quinta-feira, 25 de junho de 2015

Rawls: Aulas sobre a história da filosofia política

O canal do Departamento de Filosofia de Harvard no Youtube disponibilizou nesta semana as gravações do  mítico curso Filosofia 171 (ano letivo de 1984) ministrado por John Rawls. Grande parte do material discutido nos cursos de Rawls já haviam sido publicados pela Harvard Press após sua morte, como as Lectures in the History of Political Philosophy, Lectures in the History of Moral Philosophy (ambas publicadas em 2009) e a obra póstuma mais conhecida Justice as Fairness: A Restement (2001), na qual Rawls reformula partes importantes de sua teoria da justiça de 1971. Juntas elas formam a base dos cursos de filosofia ministrados por Rawls ao longo de 4 décadas de ensino. Todas as obras contam com tradução para o português mas, infelizmente, a tradução não é 100% confiável...

O áudio das 9 aulas disponíveis podem ser acessado abaixo (ver aqui uma tentativa de contextualizar cada aula a partir dos textos publicados de Rawls). 

"Neste ano, sem desconsiderar os riscos que isso traz, farei um pequeno experimento [...] veremos também um livro que publiquei".  








segunda-feira, 22 de junho de 2015

A vaga conservadora

Rúrion Melo (USP) publicou um texto no blog Direito e Sociedade do Estadão no qual procura entender o atual retrocesso da agenda progressista no país. Tanto o enfraquecimento do governo Dilma no congresso como a recente aliança da chamada "bancada BBB" (boi, bala e bíblia) colocam um obstáculo político não apenas as já magras possibilidade de mudanças estruturais nos próximos anos como tem sido capaz de pautar, ela própria, os principais debates ocorridos na democracia brasileira - como é o caso da redução da maioridade penal e da criminalização da (alegada) intolerância contra maiorias (como a "cristofobia" e a "heterofobia"). Contra a política da representação, argumenta Rúrion, precisamos da política da contestação. 

A vaga conservadora e seus críticos
Rúrion Melo

Da redemocratização para cá, com o suor de muita discussão pública e persistência dos movimentos sociais, muitos direitos foram conquistados, iniciou-se um deslocamento decisivo na redistribuição de renda e lutou-se por reconhecimento (questões de gênero, de raça, de sexualidade, entre outras). O avanço certamente ainda é insatisfatório, mas mostrou que a pressão por uma vida mais democrática abria possibilidades sociais e institucionais pelas quais valia a pena lutar. Se a ditadura significou um grande passo para trás, tentamos fazer com que a redemocratização, dali em diante, representasse dois para frente.
Com a disputa atual de poder, a dominação do sistema político vem acompanhada de um recuo perceptível de temas considerados progressistas e com amplo apelo na opinião pública. A recente queda de braço no Congresso Nacional tem mostrado que a direção desse jogo de forças político está rumando em sentido bastante conservador. Eduardo Cunha e Renan Calheiros, representantes escancarados de pautas culturais e políticas tradicionais (para não dizer retrógradas), surgem como protagonistas do momento, apoiados pelos interesses das bancadas BBB (bíblia, boi e bala).
O ensaio do movimento conservador atual feito pelo legislativo, que está então mais para um passo para frente e dois para trás, apresenta um leque considerável de assuntos. Da “cura gay” ao estatuto da família, do ensino religioso nas escolas públicas à PEC da redução da maioridade penal, sentimos o que penso ser apenas uma pitada daquilo que eles ainda gostariam de impor à sociedade brasileira. Deixando de lado o fato, aparentemente impensável, de que os BBB’s insistem em querer presidir precisamente as comissões de direitos humanos nos mais variados níveis (do federal ao municipal), também são intérpretes de reações surpreendentes: a defesa em prol da família, da tradição e da propriedade, capaz de sempre mobilizar milhares de pessoas, tem sido acompanhada de suas patológicas repressões contra o que chamam de “heterofobia” ou mesmo “cristofobia”.
Soma-se a isso que os escândalos do Mensalão e do Petrolão recolocaram no centro do debate público o tema da corrupção. Atmosfera propícia para dar uma guinada à direita nos princípios da ética na política. Como consequência, a onda moralizante (que é uma forma de expressão cultural e política entre outras) forjou uma aparente unidade às manifestações recentes. Que fique claro. As críticas ao governo, seja ele qual for, são necessárias e muito bem vindas, mas as razões das críticas não são sempre as mesmas, e isso muda tudo. No caso das críticas conservadoras, é digno de nota que elas pretendem lançar mão de justificações que, em princípio, valeriam inquestionavelmente para “todos”. Logo, incitam sempre temas vagos como família, violência, valores religiosos, ética, civismo, nação, patriotismo etc. Os conservadores realmente acham que vão às ruas em nome de todos (da pátria amada Brasil!), atuando no espaço público como se suas pautas e visões de mundo valessem para cada um de nós. Mas não perceberam (ou melhor, perceberam e ficaram bem preocupados) que o país tem sido disputado e criticado há muitos anos por diversos grupos sociais. As razões das críticas, ainda bem, são diferentes e, muitas vezes, opostas.
E as vozes opostas continuam nas ruas, apesar de tudo. Pois o que há de alentador não reside nas expectativas do sistema político, mas em uma esfera pública que congrega diariamente no Brasil dezenas de manifestações abertamente contrárias a essa vaga conservadora. Mesmo as mídias de massa não têm conseguido esconder tais manifestações, as quais evidentemente têm desaguado para as comunicações alternativas propiciadas, sobretudo, pela internet. Das revoltas e manifestações mais difusas até àquelas mobilizações mais organizadas na sociedade civil, ainda é possível ter a sensação de que a disputa pela democracia fará parte da formação da opinião. Isso significa que a sociedade procura estar presente tanto nas mais variadas dimensões da auto-organização social como também junto às instituições formais, tentando influenciar processos legislativos e se posicionando de maneira crítica diante das decisões do judiciário. Tal presença é ainda mais evidente no caso de pautas democráticas históricas (além das questões de justiça distributiva, há o feminismo, o antirracismo, o movimento LGBT, associações de direitos humanos).
Apesar das aparências de recente ativismo legislativo, o Congresso Nacional tem assumido uma postura prepotente e ideologicamente intimidadora. O resultado, como de costume, é fazer com que os apelos moralizantes substituam a política. Afinal, despolitização e conservadorismo se retroalimentam. Os debates levados a cabo pelos congressistas são absurdos, obscurantistas e preconceituosos. De que maneira então eles respondem às demandas dos movimentos sociais quando são pressionados, tal como tem ocorrido? Além da prepotência e do preconceito, no limite, com cassetete e spray de pimenta. De resto, Eduardo Cunha, principalmente, precisa mobilizar sua influência e poder políticos para assegurar a agenda moralizante, de olho ainda na rejeição definitiva do aborto e da liberação das drogas. Neste ponto, não é somente a sociedade que ainda poderá o incomodar, mas também o STF.
Portanto, apostar na democracia significa disputar os direitos, significa poder se contrapor a definições impostas de maneira conservadora acerca do que seja a família, a mulher, a sexualidade e o “adolescente infrator”. Caso contrário, produziremos leis ilegítimas. A esfera pública tende a barrar assim minorias excluídas que não querem nem deveriam ser silenciadas. O aprofundamento da nossa democracia depende fundamentalmente das vozes e da participação cada vez maior dos atingidos por tais questões e leis. A vaga conservadora só poderá se afirmar definitivamente vitoriosa caso se esgotem as resistências. Por sua vez, considerando que as experiências de desrespeito, exclusão, opressão e discriminação não desaparecerão da nossa vida assim tão facilmente, não faltarão também motivações para a luta por parte daqueles que compõem hoje nossa real oposição.


Rúrion Melo é professor de Ciência Política da USP e pesquisador do CEBRAP. Escreve sobre teoria crítica, direito e democracia, abordando temas relacionados à esfera pública, movimentos sociais e lutas por reconhecimento. 


quinta-feira, 18 de junho de 2015

Marta Arretche e a trajetória da desigualdade brasileira

O lançamento do livro Trajetórias da Desigualdade: como o Brasil mudou nos últimos cinquenta anos (UNESP, 2015) [ver post aqui], organizado pela cientista política Marta Arretche (USP) marca uma mudança nos estudos sobre a desigualdade no país sistematizando meio século de dados sobre o tema.

A organizadora do projeto, que envolveu mais de uma dezena de pesquisadores, concedeu uma entrevista ao Jornal da USP ("A desigualdade não é imutável") - que pode ser assistida em várias partes no link abaixo - na qual resume algumas das principais conclusões do estudo. Segundo Arretche, provamos que a alta desigualdade no país não é imutável (contrariando assim algumas expectativas pessimistas produzidas pelas ciências sociais) e que, nas últimas décadas de regime democrático, o Brasil cresceu na contramão de economistas mais desenvolvidas nas quais a desigualdade aumentou consideravelmente (outra expectativa fracassada da economia mainstream...). Contudo, a despeito desse quadro positivo, o desafio contínua: como tornar o país menos desigual e excludente? 




                                    Arretche: "A desigualdade não é imutável" (entrevista)


segunda-feira, 15 de junho de 2015

Lukes e as muitas faces do poder

Ainda que a noção de "poder" esteja presente em praticamente qualquer trabalho de teoria política, poucos são aqueles que procuraram definir o conceito de modo responsável. Nesse sentido o sociólogo inglês Steven Lukes (NYU) é uma brilhante exceção: em seu Power: A Radical View (publicado originalmente em 1976) Lukes argumenta em favor do que denomina uma visão "tridimensional" do conceito de poder. Em uma informativa entrevista para o Philbites Lukes reapresenta o núcleo de sua abordagem sobre o poder e a circunscreve no debate na ciência política norte-americana dos anos 60 e 70. 

Um definição preliminar de poder, segundo Lukes, deveria ser algo como uma relação na qual A exerce poder sobre B na medida em que A afeta o resultado da ação de B a partir dos interesses de A (A "faz acontecer" um resultado favorável aos seus próprios interesses independentemente do que B queira ou não queira). Para Lukes, no entanto, abordagens empíricas ou pluralistas de relações de poder, tal como na famosa definição de poder de Robert Dahl, tendem a enfatizar excessivamente a dimensão intencional e unilateral do poder sobre o comportamento de outros. Relações de poder nesse sentido são intencionais e empiricamente verificáveis na medida em que para todo resultado decisório poderíamos identificar interesses "vencedores" ("As") e "perdedores" ("Bs").  De fato, trata-se de um modelo importante que possui a vantagem - nenhum pouco desprezível - de permitir a mensuração empírica em processos decisórios efetivos. 

Lukes também leva em consideração a principal crítica ao modelo pluralista, a chamada "face oculta" do poder (aqui o trabalho paradigmático é Bachrach & Baratz). Segundo esse modelo, "não-ações" são tão intencionais e - portanto - tão importantes para entendermos a modificação de comportamentos alheios como as ações diretas. Por exemplo, quando um grupo consegue excluir do conjunto de possibilidades efetivas  algum resultado desagradável aos seus interesses (quando o lobby da industria e do agronegócio tiram da pauta a regulação ambiental, por exemplo) claramente estamos diante de um grupo "poderoso", isto é, um grupo que conseguem afetar a ação das pessoas de acordo com seus interesses, mas que não age diretamente sobre o comportamento dos outros: a simples manutenção do status quo é suficiente para isso. 

Entretanto, a despeito da importância dessas duas dimensões, Lukes adiciona uma terceira que, diferentemente das duas anteriores, não possui necessariamente um componente intencional, isto é, não pode ser imputado ao comportamento de um agente específico. Lukes tem em mente aqui processos de formação de crenças e preferências nos quais aqueles sujeitos ao poder não se submetem aos detentores do poder porque não conseguem resistir mas, ao contrário, na medida em que identificam seus próprios interesses com o dos dominadores. A faz com que o resultado desejável ocorra porque faz com que B queira que ele ocorra, mesmo que o resultado seja incompatível com sua estrutura de suas preferências.

Um exemplo pode ilustrar a terceira dimensão de Lukes. Hoje no Brasil discute-se a redução da maioridade penal como uma resposta prima facie legítima à violência social no país. A maioridade da população é a favor da medida mesmo que, de um ponto de vista sociológico, as classes mais pobres sejam as principais prejudicadas com a mudança da lei. Uma vez dentro do sistema criminal-penitenciário mesmo que por delitos de baixa gravidade - como é o caso da maioria absoluta das ocorrências - os jovens brasileiros terão poucas chances se conseguir se integrarem à sociedade pelo resto de suas vidas. Já as classes ricas, principais interessadas na causa, conseguirão manter o status quo econômico injusto do país sem ter de redistribuir riqueza, mas apenas aumentando a coerção policial.

Como explicar isso? Segundo a concepção de poder de Lukes estaríamos diante de um processo de "desenho de preferências". O mecanismo nesse caso é simples: comentaristas jornalísticos, apresentadores sensacionalistas e "experts" utilizam uma preferência amplamente disseminada e moralmente legítima (a sensação de impotência ou injustiça diante de uma crime violento) para inferir conclusões patentemente injustas (controle social por meio da coerção policial) e que satisfazem o interesse de uma parcela muito reduzida da sociedade brasileira (encarceramento da juventude negra periférica do país). Em nenhum aspecto podemos afirmar que se trata necessariamente de uma relação "intencional" de poder no qual uma agente exerce poder sobre outro (ainda que esse possa ser o caso de um Datena ou de um Alexandre Garcia) mas, nem por isso estaríamos livres de relações de poder quando assistimos aos telejornais todas as noites. 

Talvez a parte mais interessante da entrevista de Lukes seja a tentativa do sociólogo de aproximar sua concepção tridimensional de poder da concepção, aparentemente distinta, de Michel Foucault em obras como Vigiar e Punir e A História da Sexualidade. A comparação faz muito sentido. Para ambos os autores exercer o poder sobre alguém não implica nem violência nem restrição, duas imagens clássicas relacionadas ao poder. Ao contrário, formas mais sutis de controle podem até mesmo "criar" novas formas de comportamento sem por isso deixarem de ser coercitivas sobre os interesses daqueles sujeitos a essas relações. Prova de que podemos ter um conceito de poder rico de uma perspectiva crítica sem termos abrir mão da clareza conceitual e do rigor analítico no processo - como é o caso, infelizmente, de alguns herdeiros do projeto de Foucault.


Leituras Sugeridas: 





Chamada: Economic Justice and Political Action

Termina dia 30 de junho o processo de submissão de trabalhos para a conferência Economic Justice and Political Action organizada pela Universidade de Barcelona. O evento acontece entre os dias 7 e 9 de outubro. Além de contar com um elenco de pesquisadores excelentes (Paula Casal, Lea Ypi, Rainer Forst, etc.), o evento coincide com o ápice da corrida eleitoral espanhola, ou seja, uma oportunidade única para acompanhar a disputa do Podemos pelo poder nas eleições gerais da Espanha.

Economic Justice and Political Action
University de Barcelona – October 7, 8 and 9, 2015

Keynote speakers:
Paula Casal (ICREA-UPF)
Antoni Domènech (UB)
Rainer Forst (Goethe Frankfurt)
Susana Narotzky (UB)
César Rendueles (UCM)
Lea Ypi (LSE)

Submission guidelines:
The conference, organized by the UB Political Philosophy Seminar, will take place in October, 7, 8, and 9, 2015 in the Faculty of Philosophy at the University of Barcelona (in the historic city center). The conference will host paper presentations in the morning and two keynote presentations each afternoon.
Submission deadline is June 30, 2015. Submitted papers should be no longer than ten pages, Times New Roman 12 pt. 1.5 line spacing. They should include an abstract and a list of five keywords. To enable blind review, the name and institutional affiliation of the author should be removed and placed in an accompanying file. Both documents should be sent to jornadasfp@gmail.com.

Each submission will be anonymously reviewed by two referees. Decisions will be notified by email in July 31. No conference fee will be charged, and a limited number of accommodation grants will be offered to those whose papers are accepted. Queries can be sent tojornadasfp@gmail.com.

quinta-feira, 4 de junho de 2015



VI Meetings on Ethics and Political Philosophy
University of Minho (Braga), June 8-9, 2015

Keynote speakers:

Prof. Samuel Scheffler (NYU) will offer a lecture entitled Why Worry about Future Generations?

Prof. Simon Caney (Oxford) will offer a lecture on Global Injustice and the Rights of Necessity and Resistance.

The complete program is available here