No último mês de novembro a Universidade de Montreal organizou um fórum de discussão sobre os desafios recentes à democracia com a presença dos filósofos Charles Taylor (McGill) e Michael Sandel (Harvard). Ambos os filósofos foram extremamente importante para o que ficou conhecido nos anos 80 como o debate entre teorias da justiça (ditas) "liberais" e "comunitaristas". De maneira muito simplificada, o principal ponto de divergência entre as duas teorias diz respeito ao fundamento e aos objetivos de princípios normativos. Enquanto teorias liberais procuram justificar a distribuição de direitos centrada nas reivindicações dos indivíduos e na imparcialidade do Estado, comunitaristas como Taylor e Sandel defendem o caráter coletivo das instituições sociais e procuram justificar a realização de ideais coletivos de felicidade. Para o pensamento comunitarista, a justiça deveria ser pensada enquanto uma decorrência das reivindicações da comunidade política sobre os agentes políticos.
No debate, Taylor identifica, a partir das teses de Rosanvallon sobre o desenvolvimento histórico da democracia, uma forma de alienação contemporânea do eleitor perante a decisão das grandes questões políticas. A dificuldade de criarmos um "destino político comum", nas palavras de Taylor, por meio dos sistemas representativos seria o grande desafio de movimentos de renovação política tais como os inúmeros Occupy ao redor do mundo ou os Indignados na Europa. Já para o filósofo conservador Michael Sandel, o principal desafio político contemporâneo seria encontrar formas de contrabalancear a força atomizante do mercado sobre o bem comum. A fala de Sandel segue, em linhas gerais, as teses do seu livro mais recente O Que o Dinheiro Não Compra que já conta com tradução para o português (a conferência original que deu origem ao livro pode ser encontrada aqui).
Ainda que os conceitos de comunidade do hegeliano Taylor e do aristotélico Sandel sejam extremamente diferentes entre si, ambos os filósofos concordam que os desafios à democracia - a crise de representação e a segregação socioeconômica - antes de serem um problema de justiça (seja ela econômica ou política) representariam uma ameaça à noção partilhada de bem comum necessária, segundo os palestrantes, à reprodução dos valores das sociedades contemporâneas (ver aqui um diagnóstico similar fornecido pelo sociólogo norte-americano Robert Putnam, outro importante representante do pensamento comunitarista).