Rúrion Melo (USP) publicou uma excelente resenha do livro Vozes do Bolsa Família (Unesp 2013) nos Cadernos de Filosofia Alemã - outros posts a respeito do livro podem ser encontrados aqui. Além de apresentar as principais teses do livro e de problematizar o conceito de autonomia empregado pelos autores Alessandro Pinzani (UFSC) e Walquiria Leão (UNICAMP), Rúrion destaca o papel inovador da obra para o campo da filosofia política no país: trata-se de uma tentativa de trazer para a pesquisa na área de filosofia política problemas e dificuldades conceituais contemporâneos de nossas sociedades. Veja um trecho abaixo:
[...]
Walquiria Leão Rego e Alessandro Pinzani
dão um passo além na medida em que escolhem explicitar um ponto
de referência normativo interno aos próprios processos que pretendem
investigar e avaliar. Nosso desenvolvimento político permite ser questionado,
ademais, do ponto de vista do “projeto da modernidade” por
excelência. Tal projeto consiste na “promessa de autonomia (individual
e coletiva)” (p. 55-56), uma promessa que a própria modernidade
faz e não cumpre por razões que lhes são imanentes. Esse é um déficit
específico, portanto, da sociedade capitalista contemporânea, a saber,
“prometer autonomia para todos e não lhes oferecer as condições
reais (e não meramente formais) para desenvolvê-la” (p. 56).
Um dos aspectos peculiares da abordagem teórica proposta no
livro está voltado, assim, à investigação dos efeitos morais e políticos
sobre os beneficiários do programa tendo em vista mais precisamente
uma concepção de autonomia individual baseada, segundo os autores,
no capability approach desenvolvido por Amartya Sen e Martha
Nussbaum. Trata-se de entender antes de tudo de que maneira uma
reflexão normativa sobre a autonomia individual dependeria crucialmente
das oportunidades reais que a pessoas possuem para usufruir com
liberdade de suas próprias vidas. E o BF, ao atender às dificuldades das
pessoas em pior situação de pobreza, toca justamente nas capacidades
e oportunidades reais de seus beneficiários.
A resenha contou com uma réplica de Pinzani também publicada nos Cadernos. Esperemos que o debate sirva de inspiração às novas gerações de filósofos políticos no país.
- Pinzani: "Alcances e limites de um CCT Program: quão justificadas são as críticas ao Bolsa Família?"