quarta-feira, 18 de março de 2015

Debate: Melo e Pinzani sobre o "Vozes do Bolsa Família"

Rúrion Melo (USP) publicou uma excelente resenha do livro Vozes do Bolsa Família (Unesp 2013)  nos Cadernos de Filosofia Alemã - outros posts a respeito do livro podem ser encontrados aqui. Além de apresentar as principais teses do livro e de problematizar o conceito de autonomia empregado pelos autores Alessandro Pinzani (UFSC) e Walquiria Leão (UNICAMP), Rúrion destaca o papel inovador da obra para o campo da filosofia política no país: trata-se de uma tentativa de trazer para a pesquisa na área de filosofia política problemas e dificuldades conceituais contemporâneos de nossas sociedades. Veja um trecho abaixo:

[...]

Walquiria Leão Rego e Alessandro Pinzani dão um passo além na medida em que escolhem explicitar um ponto de referência normativo interno aos próprios processos que pretendem investigar e avaliar. Nosso desenvolvimento político permite ser questionado, ademais, do ponto de vista do “projeto da modernidade” por excelência. Tal projeto consiste na “promessa de autonomia (individual e coletiva)” (p. 55-56), uma promessa que a própria modernidade faz e não cumpre por razões que lhes são imanentes. Esse é um déficit específico, portanto, da sociedade capitalista contemporânea, a saber, “prometer autonomia para todos e não lhes oferecer as condições reais (e não meramente formais) para desenvolvê-la” (p. 56). 

Um dos aspectos peculiares da abordagem teórica proposta no livro está voltado, assim, à investigação dos efeitos morais e políticos sobre os beneficiários do programa tendo em vista mais precisamente uma concepção de autonomia individual baseada, segundo os autores, no capability approach desenvolvido por Amartya Sen e Martha Nussbaum. Trata-se de entender antes de tudo de que maneira uma reflexão normativa sobre a autonomia individual dependeria crucialmente das oportunidades reais que a pessoas possuem para usufruir com liberdade de suas próprias vidas. E o BF, ao atender às dificuldades das pessoas em pior situação de pobreza, toca justamente nas capacidades e oportunidades reais de seus beneficiários. 

A resenha contou com uma réplica de Pinzani também publicada nos Cadernos. Esperemos que o debate sirva de inspiração às novas gerações de filósofos políticos no país.