segunda-feira, 30 de março de 2015

Renato Janine Ribeiro sobre Maquiavel e a política brasileira

O filósofo e futuro ministro da educação Renato Janine Ribeiro (USP) ministrou no mês de março a aula magna da Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas da USP. Na conferência Dos Usos da Filosofia Política: Maquiavel para discutir o Brasil atual Janine discute o papel das virtudes e das paixões no pensamento político moderno e de que modo a reformulação da teoria clássica das virtudes por Maquiavel pode nos ajudar a compreender a política partidária atual. A "conquista democrática" do poder a cada 4 anos por meio do voto ("armas alheias") colocaria os chefes de Estado em uma posição análoga a do príncipe maquiaveliano. Podemos colocar a pergunta: o ministério de Janine será marcado pela fortuna ou pela virtú??

A conferência encontra-se no link abaixo: 

- Dos Usos da Filosofia Política: Maquiavel para discutir o Brasil atual

sexta-feira, 27 de março de 2015

Chamada: Economic Justice and Political Action

Inscrições abertas para a conferência Justiça Econômica e Ação Política organizada pela Universidade de Barcelona. Entre os convidados estão Rainer Forst, Paula Casal e Lea Ypi. Ótima oportunidade para conhecer a belíssima cidade de Barcelona. (Agradeço a Iñigo González pelo lembrete!).

ECONOMIC JUSTICE AND POLITICAL ACTION

University of Barcelona - October 7, 8 and 9, 2015

Confirmed keynote speakers:

Paula Casal (ICREA-UPF)

Rainer Forst (Goethe Frankfurt)

César Rendueles (UCM)

Lea Ypi (LSE)

The 2015 Political Philosophy Conference at the University of Barcelona seeks to gather contributions on political action, economic justice, and the intersection between the two. We thus invite submissions of papers—both from political philosophy and the social sciences and both contemporary and historical—on these issues:


-Political action: including papers on social movements and political parties, political participation and representation, the logic of resistance and protest, the forms and mechanisms of democracy, the possibilities and limits of ICT, and the very concept of the political.


-Economic justice: including papers on exploitation, ownership, labor, poverty, capital, consumption, care work, taxation, the commons, and inequality, as well as contributions by classic and contemporary authors addressing these issues.

-The intersection between the previous two areas: including papers addressing political actions in the economic realm (consumer boycotts, anti-eviction movements, unionism, etc.) or papers analyzing policies that target economic injustices, such as economic democracy-promoting policies, redistributive and predistributive policies, or social and economic constitutional rights.

Submission guidelines


The conference, organized by the UB Political Philosophy Seminar, will take place in October, 7, 8, and 9, 2015 in the Faculty of Philosophy at the University of Barcelona (in the historic city center, see map: http://goo.gl/LC8Rkl). The conference will host paper presentations in the morning and two keynote presentations each afternoon.

Submission deadline is June 30, 2015. Submitted papers should be no longer than ten pages, Times New Roman 12 pt. 1.5 line spacing. They should include an abstract and a list of five keywords. To enable blind review, the name and institutional affiliation of the author should be removed and placed in an accompanying file. Both documents should be sent to jornadasfp@gmail.com

Each submission will be anonymously reviewed by two referees. Decisions will be notified by email in July 31. No conference fee will be charged, and a limited number of accommodation grants will be offered to those whose papers are accepted. A selection of the accepted papers will be published—unless otherwise stated by the author—in Astrolabio. International Journal of Philosophy. Queries can be sent to jornadasfp@gmail.com


terça-feira, 24 de março de 2015

Equidade fiscal e financiamento cidadão

Krisis em grego significava o ato de ponderar ou decidir entre diferentes cursos de ação como, por exemplo, o juiz que pondera os prós e contras de uma sentença. A palavra adquiria um significado especial na democracia grega quando acontecimentos importantes obrigavam os cidadãos a debaterem e decidirem novos rumos para a comunidade política (daí falarmos em "momentos de crise" política). As alegadas crises econômica e política enfrentadas pelo país deveriam ser entendidas, de acordo com o significado original de "crise", de modo positivo, na medida em que representariam verdadeiras janelas de possibilidade para a transformação de práticas e instituições sociais injustas.

Nas últimas semanas duas discussões importantes vieram à tona na esfera pública brasileira, ambas centrais para os esforços da teoria política contemporânea: o debate sobre a reforma política (entendida, em grande medida, como uma reforma no sistema de financiamento eleitoral) e a possibilidade de uma reforma tributária no país. O ministro da fazenda Joaquim Levy propôs uma reforma ampla na tributação sobre as heranças como parte central dos esforços do seu programa de ajuste fiscal. Como afirmou o economista francês Piketty, recentemente em visita pelo país, acerca da reforma tributária:

"[o] Brasil poderia ter um sistema de imposto mais progressivo. O sistema é bastante regressivo, com altas taxas sobre o consumo para amplos setores da sociedade, enquanto os impostos diretos são relativamente pequenos. As taxas para as maiores rendas é de pouco mais de 30%, é tímido para os padrões internacionais. Países capitalistas taxam as principais rendas em 50% ou mais. Os impostos sobre herança e transmissão de capital são extremamente reduzidos, apenas 4%. Nos Estados Unidos é 40%, na Alemanha é 40%. Não discutir a cobrança de impostos sobre a riqueza no Brasil é uma loucura [...] Todos os países têm imposto sobre herança muito superiores ao brasileiro [...] Uma grande reforma tributária seria importante". 

Em O lado bomartigo publicado na Folha de S. PauloMarcelo Miterhof discute os prós e contras da tributação sobre patrimônio - tal como a iniciativa foi proposta por Levy - enfatizando os benefícios da federalização do imposto sobre heranças, hoje a cargo dos governos estaduais. Existe um consenso entre os economistas de que a tributação sobre patrimônio não apenas é subutilizada como fonte de arrecadação como também representa um dos mecanismos mais perversos de desigualdade social de recursos no país. Para dar uma dimensão das distorções, segundo o estudo do economista José Roberto Afonso (IBRE-GV), discutido no post A Reforma Tributaria no Brasilo IPVA (imposto sobre propriedade de veículos automotores) arrecada mais do que o IPTU (imposto territorial e predial urbano) em 93% dos municípios brasileiros, incluindo metrópoles como Curitiba, Belo Horizonte e Ribeirão Preto, tornando a concentração de propriedade urbana e rural (as distorções são ainda maiores quando levamos em consideração a propriedade rural) um negócio altamente rentável para os herdeiros e herdeiras brasileiros. 

Quanto a reforma política (ou contrarreforma política, a depender do propositor), os cientistas políticos Wagner Romão (UNICAMP) e Bruno Speck (USP) defenderam esse mês o financiamento cidadão dos candidatos no texto Pelo Financiamento Cidadão de Campanhas. Nesse modelo, dois mecanismos de financiamento são possíveis: ou dedução direta do financiamento eleitoral do Imposto de Renda de pessoas físicas, ou o chamado "fundo complementar", o qual complementaria com dinheiro público as doações livremente escolhidas pelos indivíduos. Nos dois casos o financiamento público de partidos políticos seria muito mais responsivo aos interesses e valores dos indivíduos representados do que no modelo atual pautado por critérios exógenos de distribuição:

"[t]emos duas propostas. A primeira se daria pela renúncia fiscal de parte das doações. Com um teto máximo, que poderia ser de até R$ 1.000,00, por exemplo, o cidadão teria parte de sua doação deduzida da base de renda para fins de cálculo do Imposto de Renda (IR). Hoje, toda contribuição a candidatos ou partidos precisa ser informada à Receita, mas isso não é deduzido do IR por falta de amparo na lei. [...]  A segunda proposta é um financiamento de fundos complementares. Para cada doação por cidadão, o partido receberia um valor complementar diretamente do Fundo Partidário. Se o cidadão fizer uma doação de R$ 50, o Estado complementaria com mais R$ 50 transferidos do Fundo Partidário. Caso a doação ultrapasse R$ 100, o complemento pelo Estado fica limitado a um teto de R$ 100 por eleitor". 

Ambas as discussões satisfazem o sentido propositivo presente nos momentos de crise e constituem um estimulante cenário de mudanças, tanto para a política brasileira como para o papel da teoria política brasileira.

Agradeço a Samir Almeida e a Anildo Rodrigues pelas indicações e comentários.  

segunda-feira, 23 de março de 2015

Chamada: Brave New World (Manchester)

As submissões para a conferência anual de pós-graduação do Centro de Teoria Política da Universidade de Manchester (MANCEPT) encerram-se dia 30/04. O evento será nos dias 25 e 26 de junho e contará com Jeff Mc-Mahan (Oxford) e Serena Olsaretti (Pompeu Fabra) como palestrantes convidados. O centro é uma das instituições dedicadas à pesquisa em Teoria Política mais vibrantes da Europa.  

We invite submissions for Brave New World 2015, the nineteenth annual postgraduate conference organised by the Manchester Centre for Political Theory (MANCEPT). The conference will take place on Thursday 25th and Friday 26th of June 2015 at the University of Manchester.
We are pleased to announce that our keynote speakers this year will be:
  • Jeff McMahan (University of Oxford, Oxford): “Proportionality in Defense Against Inflictors of Many Small Harms”
  • Serena Olsaretti (ICREA-Universitat Pompeu Fabra, Barcelona): “Children as Negative Externalities”
The Brave New World conference series is a leading international forum dedicated to the discussion of postgraduate research in political theory. Participants will have the chance to meet and talk about their work with eminent academics, including members of faculty from the University of Manchester as well as the guest speakers who will deliver plenary addresses.
Guest speakers in previous years have included: David Archard, Richard Arneson, Brian Barry, Simon Caney, G.A. Cohen, Roger Crisp, Cecile Fabre, Jerry Gaus, Bob Goodin, Peter Jones, Chandran Kukathas, Kasper Lippert-Rasmussen, Susan Mendus, David Miller, Onora O’Neill, Michael Otsuka, Bhikhu Parekh, Carole Pateman, Anne Phillips, Thomas Pogge, Joseph Raz, Andrea Sangiovanni, Samuel Sheffler, Quentin Skinner, Hillel Steiner, Adam Swift, Philippe Van Parijs, Leif Wenar, Andrew Williams and Jonathan Wolff. 
Submission guidelines:
The deadline for submissions is 30 April 2015. If you would like to present a paper, please send an abstract of approximately 400 words in MS Word format and prepared for blind review to brave.new.world@manchester.ac.uk. Please also state your name and institutional affiliation in the email. Papers focusing on any area of political theory or political philosophy are welcome.
Notices of acceptance will be sent by 8 May 2015.
We offer a number of bursaries for presenters to cover accommodation and travel expenses. These will be allocated according to need. If you wish to be considered for a bursary, please say so when submitting your abstract and state where you will be travelling from and any other sources of funding you have available to cover costs.  For further details please contact us at brave.new.world@manchester.ac.uk.

Chamada: Understanding the Politics and Ethics of Disobedience

Está aberta uma chamada para trabalhos relacionados ao tema da desobediência - tanto em seus aspectos políticos como éticos - a serem apresentados na 31a. conferência da IPSA em filosofia política, a ser realizada entre os dias 27 e 29 de setembro (2015). O prazo final para o envio de trabalhos é 1/07. 


Disobey! Understanding the Politics and Ethics of Disobedience

Sciences Po & IPSA RC 31 Conference

Paris, September 27-29, 2015

Key-note Speakers: Kimberley Brownlee (University of Warwick), Frédéric Gros (Sciences Po).
Organizing & Selection Committee: Astrid von Busekist (Sciences Po), Fréderic Gros (Sciences Po), John Medearis (University of California Riverside), Andrei Poama (Sciences Po), Maurits de Jongh (Sciences Po).
IPSA’s Research Committee on Political Philosophy (RC31) and Sciences Po, Paris are pleased to announce that a jointly organized conference on disobedience will be taking place at Sciences Po, Paris. The purpose of this conference is to explore the content and to assess the force of contemporary injunctions to disobey. In doing so, we want to step back from those dominant views that concentrate primarily on the question of civil disobedience, and see if there are other less visible forms of disobedience that demand closer theoretical scrutiny. Our conceptual bet is that disobedience does not have to be civil in order for it to matter politically and ethically. We intend to ask what is the meaning of disobedience, reflect on how disobedience gives rise to particular social movements and ideals, analyze the extent to which the morality of disobedient acts is practice-dependent, and think about whether there are categorically distinct types of disobedience.

The conference takes into account both the multiplicity of disobedient experiences, and the plurality of views that aim to justify or denounce them. We aim to investigate this twofold reality by raising questions such as the following:
  • What counts as a disobedient act? Does the idea of passive disobedience make sense? Can disobedience give rise to stable practices, or is disobedience bound to be diachronically unstable? Do historically documented cases of disobedience matter for the understanding of disobedience today? Do disobedient actors have any good moral, prudential or political reasons to inform themselves about the history of disobedience?
  • Can a sound case be made for illiberal forms of disobedience – such as resistance to gay marriage or abortion rights – or uncivil disobedience, such vigilante and militia groups? Does disobedience have to take a non-violent form in order for it to be justified or is there a case one can make for certain coercive forms of disobedience? Should we reconsider our views about repellent episodes of disobedience if they have proved to have morally and politically desirable effects in the long run?
  • Does it make sense to analyze certain actions taken by state officials – say, jury nullification, virtuous perjury, or assisting the evasion of an unjustly imprisoned person – as cases of disobedience? Can disobedience be codified in the form of a prerogative or is legally sanctioned disobedience bound to be a contradiction in terms? Can disobedience be justified in (ideally) well-ordered societies?
  • What counts as a good theory of disobedience? How should we think about the relationship between normative and critical accounts of disobedience? Is a general theory of disobedience possible? Should we aim for an exhaustive typology of disobedience or is disobedience structurally open-ended and destined to remain an “essentially contested concept”?
If you are interested in presenting a paper at this conference, please send a 500 word-long abstract to the following e-mail addresses: theoriespo@gmail.com and john.medearis@ucr.edu by July 1st, 2015. Please include the words Disobey Conference in the subject line. Approximately 15 papers will be selected. The working languages of the conference are English and French. Dinner, and light refreshments will be provided for the whole duration of the conference, but unfortunately we cannot pay for transportation or accommodation. We welcome contributions from the fields of political theory, legal philosophy, the history of political though, and ethics.



quarta-feira, 18 de março de 2015

Debate: Melo e Pinzani sobre o "Vozes do Bolsa Família"

Rúrion Melo (USP) publicou uma excelente resenha do livro Vozes do Bolsa Família (Unesp 2013)  nos Cadernos de Filosofia Alemã - outros posts a respeito do livro podem ser encontrados aqui. Além de apresentar as principais teses do livro e de problematizar o conceito de autonomia empregado pelos autores Alessandro Pinzani (UFSC) e Walquiria Leão (UNICAMP), Rúrion destaca o papel inovador da obra para o campo da filosofia política no país: trata-se de uma tentativa de trazer para a pesquisa na área de filosofia política problemas e dificuldades conceituais contemporâneos de nossas sociedades. Veja um trecho abaixo:

[...]

Walquiria Leão Rego e Alessandro Pinzani dão um passo além na medida em que escolhem explicitar um ponto de referência normativo interno aos próprios processos que pretendem investigar e avaliar. Nosso desenvolvimento político permite ser questionado, ademais, do ponto de vista do “projeto da modernidade” por excelência. Tal projeto consiste na “promessa de autonomia (individual e coletiva)” (p. 55-56), uma promessa que a própria modernidade faz e não cumpre por razões que lhes são imanentes. Esse é um déficit específico, portanto, da sociedade capitalista contemporânea, a saber, “prometer autonomia para todos e não lhes oferecer as condições reais (e não meramente formais) para desenvolvê-la” (p. 56). 

Um dos aspectos peculiares da abordagem teórica proposta no livro está voltado, assim, à investigação dos efeitos morais e políticos sobre os beneficiários do programa tendo em vista mais precisamente uma concepção de autonomia individual baseada, segundo os autores, no capability approach desenvolvido por Amartya Sen e Martha Nussbaum. Trata-se de entender antes de tudo de que maneira uma reflexão normativa sobre a autonomia individual dependeria crucialmente das oportunidades reais que a pessoas possuem para usufruir com liberdade de suas próprias vidas. E o BF, ao atender às dificuldades das pessoas em pior situação de pobreza, toca justamente nas capacidades e oportunidades reais de seus beneficiários. 

A resenha contou com uma réplica de Pinzani também publicada nos Cadernos. Esperemos que o debate sirva de inspiração às novas gerações de filósofos políticos no país.




Programação de Seminários DCP-USP (2015)

A grade de Seminários de Pós-Graduação de Ciência Política da USP já se encontra no ar. O primeiro seminário, "The Politics of Constitutional Change in Latin America", será ministrado quinta-feira  (19/03) pelo professor Grabriel Negretto (CIDE/Mexico) autor do livro Making Constitutions: Presidents, Parties, and Instituional Choice in Latin America (Cambridge Press). Na área de teoria política destaque para as palestras de Alessandro Pinzani ("As dificuldades de fazer crítica social"), Conrado Hubner Mendes ("Constitutional courts and deliberative democracy") e Luis Felipe Miguel ("Representação política e desigualdades sociais"). Os seminários são semanais e abertos ao público em geral. 





quinta-feira, 12 de março de 2015

Debate sobre reforma política na FGV-SP

Na próxima quarta-feira (18/03) a FGV-SP organizará o seminário Reforma Política: o que deve ser feito e o que será feito? sobre as possibilidades de uma reforma política ampla no país. A pauta da reforma tem sido apoiada tanto pelo governo como pela oposição, mas existem pouquíssimos pontos consensuais seja sobre a natureza seja sobre a desejabilidade da iniciativa para o sistema político nacional (veja o post A Contrarreforma Política). Os palestrantes convidados são Fernando Limongi (USP), Bruno Speck (USP) e George Avelino (FGV). A presença deve ser confirmada pelo email: coordcgapn@fgv.br . 





terça-feira, 10 de março de 2015

Renda básica e respeito

Deborah Padfield publicou na plataforma inglesa openDemocracy o artigo Basic Income - Basic Respect ponderando as vantagens e desvantagens da adoção da Rena Básica Incondicional (ou UBI em inglês) como uma solução política de curto prazo para os problemas do sistema de bem-estar social no Reino Unido. Segundo Padfield a ideia de pagar regularmente a todos os cidadãos e cidadãs britânicos uma quantia fixa em espécie sem qualquer forma de condicionalidade possui uma série de vantagens em relação ao sistema vigente, em especial a efetivação de uma rede de segurança social universal e a ruptura da ligação, até o momento essencial, entre direito à riqueza social e formas de remuneradas de trabalho. Entretanto, a principal bandeira do movimento para a autora deveria ser pautada na forma de respeito básico que a RBI oferece a cada indivíduo. Apenas a conjunção entre o pagamento individualizado (e não familiar) e sem condicionalidades (não sujeito aos testes de renda e capacidade) é capaz de empoderar nossas decisões pessoais contra diferentes mecanismos de dominação política e exploração econômica:

Basic Income could assure [...] sufficient income for food and warmth at very least, something our ruthlessly conditional benefits system denies. It could give time to gather strength, look for a sustainable job rather than the first on offer, again something contrary to government's policy of forcing claimants back into work as quickly as possible. And it could value unpaid work by enabling people to do what they need to do as carers, parents, children and neighbors, or choose to do as voluntary workers. All everyday freedoms for wealthier people.
Já entre as principais desvantagens apontadas pela autora encontram-se a necessidade de uma reestruturação econômica mais profunda da economia, como a integração dos trabalhadores imigrantes e a resolução da atual crise de habitação européia, e, principalmente, a forte aversão político-eleitoral à remuneração de formas não assalariadas de trabalho (ou mesmo de trabalho nenhum). Adequar a RBI às exigências de contribuição ou a cláusulas de reciprocidade social é alterar um elemento central da proposta (veja o artigo abaixo).

O texto de Padfield coloca a questão: não seria a RBI uma forma de desrespeito aos esforços produtivos das pessoas? Recentemente o teórico político português Roberto Merrill (Minho) publicou uma excelente intervenção no site Esquerda.Net sobre o argumento da alegada exploração das capacidades produtivas dos indivíduos dispostos a trabalhar em uma sociedade regulada pela RBI - também conhecido como Rendimento Básico Incondicional por lá. Merril examina diferentes linhas de defesa do Rendimento Básico (rejeição da ética do trabalho, valorização de contribuições não-remuneradas, preço baixo a ser pago, etc.) e conclui dando ênfase ao caráter "pré-distributivo" da proposta, isto é, a capacidade de empoderar os cidadãos com recursos econômicos antes de participarem ativamente no processo de produção da riqueza social, e não apenas como alvo de políticas de redistribuição de renda:

O RBI representa a garantia de uma certa autonomia face às relações de mercado ou, pelo menos, de uma capacidade de resistência relativamente aos termos desvantajosos que outros podem querer impor-nos enquanto outorgantes; é uma resposta a uma exigência de “reciprocidade honesta” entre os cidadãos e a melhor via de acesso à apropriação justa dos bens. Um RBI muda a estrutura dos resultados do mercado antes que eles ocorram, alterando a posição que os indivíduos têm quando chegam ao mercado. Na realidade, o RBI pode ser compreendido como uma política de redistribuição, mas qualquer política que tenha um efeito de mudança de poder de mercado é nesse sentido pré-distributiva, mesmo que se possa olhar para ela ao mesmo tempo como redistributiva. Julgo que a motivação mais profunda por trás da pré-distribuição é que queremos uma sociedade mais igualitária em termos de distribuição de poder, e não apenas de dinheiro, e também queremos que o mercado seja estruturado de tal forma que ele ofereça oportunidades reais para os indivíduos exercerem poder económico. “Pré-distribuição” é, então, o nome de um tipo de estratégia que permite realizar esses princípios igualitários mais profundos.


Basic Income - basic respect

“Unconditional Basic Income (UBI) is an amount of money paid on a regular basis to each individual unconditionally and universally, high enough to ensure a material existence and participation in society”. Among the 'ten reasons to support' it are provision of a stronger safety net for everyone, giving more choice of paid and unpaid work and allowing unpaid work to be revalued. So says Basic Income UK.
Fundamentally, BI is about respecting people. Is it a good idea?
Three stories that signal 'yes'.
These are versions of situations I've met again and again. They are far from extreme.
Young woman - call her Tina. Earned full-time till her husband left. Her fixed-term contract wasn't renewed. Husband didn't pay towards the mortgage. There was a 13-week wait between signing on for Job-Seekers Allowance (JSA) and getting help with mortgage interest. Savings quickly dwindled. They were incomers to their village, with no local network. Tina's JSA claim ended because she didn't make it to the initial JobCentre Plus interview: no money for two buses each way. JCPlus would have refunded that travel cost (though not for regular signing-on) but she didn't have the cash up-front. She'd twice walked five miles each way to the supermarket to get cut-price food at the end of the day: tough in icy weather, returning to an unheated house. She lived on tea and bread for days. No food, no heat, debts rising, home at risk. In our prosperous, well-populated Home Counties, it's terrifying how isolated you can abruptly become. Once she ran out of money for her mobile, she'd be utterly cut off.
Gary, an accountant. Bi-Polar Disorder, not bad enough normally to prevent him working but work stress triggered an episode. He lost his job. Went on Employment & Support Allowance (ESA) then was found fit for work and moved to JSA.  After a couple of months his JobCentre Plus 'adviser' told him to apply for a job. He was offered it on condition he do it 'self-employed'. If he refused, his JSA would be stopped. So he took it though he dreaded the uncertainties. The work was intermittent; he made a mess of his paperwork; owed money on rent, council tax, income tax, working tax credit overpayment; lost the contract. Spiralling downwards.
Sue cares for her daughter Karen, diagnosed with fibromyalgia and borderline personality disorder. Karen's moods are erratic and she self-harms. Sue can't leave her alone for long. But Karen's conditions are hard to prove for disability benefits, and unless she has the right rate of Disability Living Allowance (or the new Personal Independence Payment) Sue can't get Carer's Allowance (£61.35pw, gateway to a small Income Support top-up). When Karen's DLA was reduced, Sue suddenly had no income.
Three possible fruits of Basic Income
Basic Income could assure these people sufficient income for food and warmth at very least, something our ruthlessly conditional benefits system denies.
It could give time to gather strength, look for a sustainable job rather than the first on offer, again something contrary to government's policy of forcing claimants back into work as quickly as possible.
And it could value unpaid work by enabling people to do what they need to do as carers, parents, children and neighbours, or choose to do as voluntary workers. All everyday freedoms for wealthier people. 
A trap?
It's alluring. Yet household incomes, whether from wages, benefits, tax credits or Basic Income (BI), can't alone deal with poverty or inequalities. Few supporters think it can. Unless it is considered as part of - and consequent upon - a major reorientation of our economy, BI is a straw man destined to go down in flames.
This is, I fear, a potential trap. Government has a highly effective tactic of using welfare spending as a distraction from fundamental political and economic questions. Focusing on BI with its obvious up-front costs and challenges could play into that, diverting attention from the restructuring on which it depends.

quinta-feira, 5 de março de 2015

Concurso de Teoria Política (UFMG)

Está aberto edital para vaga de professor adjunto de Teoria Política, nas áreas de gênero e de movimentos sociais no Departamento de Ciência Política da UFMG. O prazo para as inscrições é de 4 meses a partir da publicação do edital, dia 19/02. 

Mais informações sobre o edital (e sobre as demais vagas) no site da UFMG


Kimberley Brownlee no Direito (USP)

Kimberley Brownlee (Warwick) estará no Faculdade de Direito da USP no próximo dia 11/03. A pesquisadora notabilizou-se nos últimos anos como uma das teóricas mais importantes da desobediência civil, o ato de contestar publicar leis injustas em regimes constitucionais. As ideais de Brownlee, e sua reinterpretação da teoria rawlsiana da desobediência civil, já foram assunto do blog, ver aqui. A conferência faz parte de um ciclo de debates sobre direito constitucional. 




domingo, 1 de março de 2015

Renda Básica em SP

Na semana passada, o ex-senador Eduardo Suplicy (PT) anunciou que irá abdicar do seu salário de secretário municipal de direitos humanos e reverterá o dinheiro para os esforços da prefeitura de Fernando Haddad (PT) para a implementação da Renda Básica de Cidadania na metrópole. Trata-se de uma excelente notícia para os apoiadores da Renda Básica Universal, modelo que prevê o pagamento de benefícios sociais diretamente em dinheiro e sem condicionalidades a todos os residentes permanentes em um país. Como define o filósofo belga, e ex-professor de Suplicy, Philippe Van Parijs (Université Catholique de Louvin), os objetivos de uma renda básica incondicional para todos são ao mesmo tempo eficientes e moralmente justificados: trata-se de garantir a liberdade substantiva para todos por meio dos recursos materiais básicos que precisamos para perseguir nossos objetivos individuais (ver o debate A Basic Income for All organizado pela Boston Review em 2000 no qual Van Parijs apresenta e debate a Renda Básica com economistas, filósofos e ativistas). 

A luta de Suplicy pela implementação da Renda Básica no país integra os esforços da rede global Basic Income Network (BIEN), plataforma que agrega pesquisadores, movimentos sociais e partidos políticos socialistas, feministas e ambientalistas que possuem o modelo de distribuição como bandeira comum. O movimento cresce na Europa. especialmente na Bélgica, na Holanda, na Grécia e em Portugal, e já conta com uma surpreendente experiência real no inesperado estado norte-americano do Alaska. Além de ter dedicado sua carreira como senador à causa, Suplicy ficou famoso entre os adeptos da renda básica universal ao protagonizar um debate com o economista ultra-neoliberal Milton Friedman no ano 2000 sobre a questão (Um Diálogo com Milton Friedman sobre o Imposto de Renda Negativo). Suplicy e Cristovam Buarque apresentaram as bases para a adoção da renda mínima no Brasil no artigo Garantia de Renda Mínima para Erradicar a Pobreza: o debate e a experiência brasileiros de 1997. 

Contudo, uma das apresentações mais simples e direta das ideias por trás da Renda Básica Universal pode ser encontrado no livro-panfleto The Little Books of Ideas escrito, publicado e distribuído  pelo grupo Occupy Londres. Abaixo fiz uma tradução livre do verbete Basic Income:


2. Renda Básica Universal 
(algumas vezes denominada Renda Cidadã)


O conceito por trás da Renda Básica é o de que a todos os cidadãos e/ou residentes será pago um benefício fixo estipulado para que uma pessoa possa conduzir sua vida de modo livre – i. e. em princípio uma valor equivalente à linha de pobreza no país em questão. O benefício seria pago incondicionalmente a partir de taxação geral (sem considerar se a pessoa beneficiada encontra-se empregada ou não e nem possui outras fontes de renda). O benefício não entraria em conflito com o direito a outros serviços públicos oferecidos pela Estado tais como o Sistema Único de Saúde, a escolaridade básica, etc. Apoiadores dessa política sustentam que ela irá:


  • Garantir que as necessidades básicas de todos e todas sejam atendidas por meio de uma pagamento semanal sem o uso de “teste de recursos”.

  • Economizar dinheiro público ao livrar-nos de partes inteiras da burocracia dos sistemas de benefícios atuais (por exemplo, não haveria mais a necessidade de um seguro-desemprego, ou do Fundo de Garantia compulsório).

  • Assegurar que todos que tenham trabalho remunerado estejam sempre em condição financeira melhor ao fazer isso do que o evitando (impossibilitando com isso contextos de “armadilha de pobreza”, nas quais as pessoas acabam aceitando empregos que pagam menos do que receberiam por meio dos benefícios sociais garantidos apenas por conta da insegurança do desemprego).

  • Tornar a opção por empregos de meio período mais atrativa para as pessoas que a preferirem.

  • Atuar como uma rede de proteção para quem optar por assumir os riscos da livre-inciativa econômica

  • Reconhecer oficialmente o valor do trabalho não-remunerado das responsáveis pela criação familiar

  • Permitir que as pessoas que queiram dedicar-se integralmente à trabalhos voluntários ou de caridade possam fazê-lo sem terem de abrir mão de uma renda pessoal.

Opositores da proposta argumentam que ela estimulará a ociosidade e trabalhadores preguiçosos. Além do mais ela iria contra os princípios da ética do trabalho. Eles também argumentam que o programa não é exequível financeiramente e que o sistema tributário teria de aumentar abruptamente para financiá-lo. (Estimativas inglesas indicam que uma Renda Básica em torno de £ 200 por semana possa exigir um imposto de renda de algo como 60% dos rendimentos).  


Leituras adicionais: